Cultura

Rússia: 3 sugestões de leitura

“Rússia invade Ucrânia e atira Mundo para nova Guerra Fria”.
Foi esta a bomba que nos assombrou às primeiras horas do dia 24 de fevereiro de 2022.

Muitos já não julgavam ser possível, em pleno séc. XXI, acabados de sair de uma pandemia que nos enfraqueceu a esperança e as perspetivas, assistir a um conflito bélico com estas características. Julgávamos que a História nos teria já ensinado que erros não voltar a cometer – ou que erros não deveríamos deixar cometer. Num mundo dominado pelo digital, e pela realidade a acontecer em direto no ecrã que já tem lugar cativo na palma da nossa mão, urge também conhecer a História, para compreender o presente. É imperativo que não nos deixemos cair na tentação da opinião fácil e desinformada, cada vez mais comum no palco das redes socais.

Por isso mesmo, sugerimos 3 livros que podem ajudar a compreender as raízes e o contexto de um dos acontecimentos mais terríveis desde a II Guerra Mundial.

1 - A Mais Breve História da Rússia - Dos Eslavos a Putin, de José Milhazes

Nação de proporções colossais ou continente? Luz do mundo ou terra condenada? Aliado da Europa e do Ocidente ou seu adversário mortal? Território de santos, czares, poetas, pintores, revolucionários e músicos, a Rússia é um enorme mistério que importa desvendar. Esconde uma história tão rica, antiga e diversa quanto desconhecida. José Milhazes, o grande especialista português da Rússia, propõe neste livro uma viagem fascinante que atravessa séculos e séculos da história, cultura e civilização russas, que começa nos povos eslavos vários séculos antes de Cristo e acaba na actualidade, com Putin. Nesta edição que inclui dezenas de fotografias e mapas - além de uma cronologia e de bibliografia aconselhada para quem quiser saber mais - fique a conhecer a geografia, os povos, as grandes figuras, efemérides e feitos desta grande nação em permanente devir.

“A Rússia dos nossos dias abrange um enorme território com uma área aproximada de 17 milhões de Km2, atravessado por mais de dez fusos horários, com terras eternamente congeladas, densas florestas e infindas estepes, extensos rios e lagos, fazendo fronteira com 16 países. Foi palco de inúmeros acontecimentos e conflitos, de expansões e invasões, de conquistas e derrotas, mas soube preservar o seu principal núcleo, uma civilização com um papel de charneira entre a Europa e a Ásia, detentora de uma cultura rica e de uma massa humana que se distingue em muitos domínios do conhecimento e das artes. A extensão e diversidade deste enorme território, que alcança os limites geográficos da Eurásia, torna a Rússia, aos olhos de muitos, difícil de ser entendida como um país. Mas a uniformidade das suas características civilizacionais desaconselha a que se tenha dela visões redutoras.

Foi difícil escrever este livro, pois uma breve história implica uma selecção dos factos mais importantes, o que lhe dá um cunho muito pessoa e subjectivo. Mas o seu objectivo é meritório, pretende dar ao leitor uma ferramenta útil para a compreensão da vida passada e presente do maior país do mundo. Saber como surgiu e se desenvolveu um país que ao longo da sua história teve vários nomes – Rus, Moscóvia, Império Russo, União Soviética, Federação da Rússia -, conhecer como nesse território coexistiram, e ainda coexistem, cerca de 160 povos com culturas muito diversas, indagar sobre as personagens, acontecimentos e feitos mais marcantes da história do povo russo. São estes e outros temas que o leitor encontrará em A Mais Breve História da Rússia.

Após a leitura do livro o leitor poderá decidir com qual das opiniões dos escritores clássicos russos se identifica mais, sendo que elas não são necessariamente conflituantes entre si:

“Um problema difícil apresenta-se incessantemente ao russo: o dilema de organizar o seu vasto território. A imensidão da Rússia e a ausência de limites ficou gravada na estrutura da alma russa.
O panorama da alma russa corresponde ao panorama da Rússia, a mesma falta de limites, falta de formas, alcançando a infinidade.”
Nikolai Berdiáev, filósofo

“Estou longe de admirar tudo o que vejo a meu redor… Mas juro por minha honra que por nada no mundo eu gostaria de trocar
a minha pátria ou de ter qualquer história diferente daquela de nossos ancestrais, como Deus nos deu.”
Alexandre Puchkin

“É a nossa apatia russa: não sentir as responsabilidades advindas dos nossos direitos e consequentemente negá-las.”
Lev Tolstói

Do Preâmbulo – Rússia: país ou continente?

2 - História da Rússia, de Gregory L. Freeze

Este livro trespassa os mitos e mistérios que envolvem a Rússia desde os seus primórdios, com revelações de arquivos confidenciais cuja existência se desconhecia até há pouco tempo. Uma equipa distinta de historiadores removeu a propaganda e os preconceitos do passado para contar a história definitiva da Rússia, desde o seu início em Kiev e no Principado Moscovita até aos três últimos séculos de império, revolução, comunismo, crise pós-soviética e reconstrução. Esta edição atualizada abrange ainda os desenvolvimentos desde a era de Putin até à primeira década do século XXI, constituindo uma história por si mesma envolvente e essencial para todos aqueles que se interessam pela Rússia e pelo lugar que este país ocupa no mundo.

3 - A Invenção da Nova Rússia, de Arkady Ostrovky

A dissolução da União soviética gerou uma onde de optimismo pelo mundo fora. Hoje em dia, no entanto, a Rússia é encarada como um país desestabilizador e uma ameaça à paz. Como é que um país que se libertou de setenta anos de governação soviética acabou como uma das maiores ameaças ao Ocidente e, até, ao seu próprio futuro? porque é que as pessoas que rejeitaram a ideologia comunista acabaram por aceitar a propaganda do Estado? Neste livro ousado e esclarecedor, Arkady Ostrovsky conduz o leitor numa viagem apaixonante através da transformação tumultuosa da Rússia pós-soviética e analisa os principais pontos de viragem que muitas vezes apanharam o mundo de surpresa.

“Passava da meia-noite do dia 27 de fevereiro de 2015. Eu estava a fazer as alterações finais neste livro, quando soube que Boris Nemtsov, um político liberal que outrora fora apontado como futuro presidente da Rússia, tinha sido baleado quatro vezes nas costas quando passava por uma ponte a escassa distância do Kremlin.
Era o assassínio político mais ressonante na história da Rússia pós-soviética e parecia um sonho. Eu conhecia Nemtsov – era mais do que uma fonte para mim. De todos os políticos russos com quem mantinha contacto, era o único que eu considerava um amigo. Era carismático, determinado, honesto, despretensioso e cheio de vida. O seu corpo avantajado jazia agora no asfalto molhado, coberto por sacos de lixo pretos, com as cúpulas de São Basílio atrás dele: era um homicídio de bilhete-postal – continue-se para lá da imagem da capa deste livro e chegar-se-á ao local.
Os assassinos de Nemtsov agiram com descaramento e não estavam à espera de ser detidos. Quando um deles o foi, chegou-se à conclusão de que se tratava de um oficial ligado ao serviço de Ramzan Kadyrov, o homem-forte da Chechénia e antigo rebelde colocado no poder pelo presidente russo Vladimir Putin para manter o território sob o seu controlo. Kadyrov jurara lealdade pessoal a Putin, ajudara a anexar a Crimeia e rapidamente saiu em defesa do suposto homicida dizendo que se tratava de um «verdadeiro patriota».”

Do Prólogo – Uma Procissão Silenciosa

Artigo original: Bertrand Livreiros